Comecei a correr com 17 anos pelas areias de Santos. Para uma adolescente, era o significado de liberdade: meu momento de sair de casa sozinha, ser independente. A constância rendeu condicionamento, e em alguns meses já aguentava os 10 km — que emoção era dizer que cruzara a cidade correndo!
Logo na sequência entrei na faculdade de economia da Universidade de São Paulo (FEA USP) e um dos primeiros convites foi disputar o BICHUSP, o torneio entre calouros das faculdades. Já corria, então resolvi ir para o atletismo, me aventurar na prova mais longa: os 1500 metros. Dou risada de lembrar da minha ingenuidade ao achar que seria como as tranquilas corridas na praia. Foi dolorido e intenso: passei a prova inteira disputando a primeira colocação com a adversária da medicina, descobri músculos que nem sabia que tinha e minha boca parecia mais seca que um deserto. Terminei com a prata, mas aparentemente fiz um bom tempo e virei a principal meio-fundista da equipe. Lá encontrei uma família fora de casa: foi onde me senti acolhida, fiz meus maiores amigos e descobri a paixão pela corrida. Virei obcecada, de uma forma positiva. Treinei por toda a minha graduação, fazendo as provas de meio-fundo e fundo (além de arriscar uns 400 metros). Conquistei os recordes da faculdade no 4x400m, 800m, 1500m e 5000 metros e várias medalhas nos torneios universitários, com destaque para o ouro no TUNA, meu melhor tempo dos 1500m, 5:13, (e o talvez momento mais feliz da minha vida).
A importância do esporte
Formei-me economista, mas brinco que minha graduação foi em atletismo! Brincadeiras à parte, poderia discorrer sem parar aqui sobre a importância do esporte durante a faculdade, seja na minha formação como profissional, quanto pessoal. Fui incansavelmente treinada em persistência, resiliência, liderança, coordenação de “projetos”, definição de objetivos, motivação, trabalhar em equipe, lidar com a falha e a frustração, interpretar positivamente o estresse e ansiedade, proatividade, autoconfiança… — capacidades essenciais para o mercado e a carreira e cruciais no início da minha trajetória profissional.
A corrida treina o corpo mas também treina a mente
Não me canso de falar. Em segundo lugar, expandi minha rede de contatos (vulgo, meus amigos mais próximos com um vínculo fortíssimo) para pessoas de outros cursos, anos e interesses, que não conheceria ou me aproximaria de outra forma. Em terceiro, descobri uma receita para minha própria felicidade, rendendo um intenso processo de autoconhecimento.
Economia comportamental
Por fim, acabei direcionando minha carreira para uma área nova dentro da economia, a economia comportamental. Muitas das problemáticas envolviam componentes que estava super familiarizada em viver e experimentar constantemente na corrida, o que talvez tenha me aproximado e permitido me relacionar com maior profundidade aos temas: motivação, autocontrole, hábitos, mentalidade de crescimento, garra… Quando você ama tanto um assunto, acho que passa a interpretar a realidade a partir desta ótica, e foi um pouco isso o que aconteceu comigo: a corrida vira a principal metáfora, analogia e fonte de exemplos para explicar e entender o comportamento humano, meu objeto de estudos.
Estilo de vida saudável
Hoje trabalho como cientista comportamental, aplicando os conceitos da área na promoção de um estilo de vida saudável, com foco na alimentação, na Liti Saúde. Uma empreitada inovadora e dinâmica, que tem sido super recompensadora. Além disso, durante a pandemia passei a me aventurar nas provas de fundo, como a meia maratona e os 10 km. Recentemente comecei a treinar com o Wanderlei Oliveira e estou mais motivada do que nunca a melhorar meus tempos, tendo o suporte para tal (domingo foi dia de 42 minutos e 31 segundos nos 10 km A Tribuna, aliás, e a felicidade e empolgação ainda reverbera nesta que vos escreve).
Autoconhecimento
Serei honesta. Por vezes, me pego pensando: sempre terão melhores atletas. Qual o propósito de todo este esforço — seria apenas uma busca pelo ego, uma tentativa alegórica de carreira paralela? Acho que, mais do que tudo, tenho na corrida uma ferramenta para melhor conhecer o mundo e a mim mesma. É um processo de constante aprendizado, descobertas e de expressão de quem sou. E acho que essa relação ninguém e nada me tira – e tudo me retorna.
Flora Finamor Pfeifer, 24 anos, Head de Ciências Comportamentais na @litisaude e corredora nas horas vagas (@florafinamor)
Ps: aos interessados, escrevo um pouquinho sobre estes temas no @cronicasdecorrida e falei recentemente sobre a relação da economia comportamental com a corrida no Podcast Três Lados da Corrida e há um tempo no podcast Corredores do Fundão
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