Qual o papel do esporte?

Jogos Olímpicos de Paris – Flora Pfeifer (@florafinamor)

Qual o papel do esporte? Perguntei a um jornalista durante as Olimpíadas.

A pergunta feita era um eco de minhas próprias questões internas: por que passava tanto tempo falando sobre, vendo e praticando isso? Qual a função do esporte e destes jogos, e por que isso era capaz de prender tanto minha atenção?

        Eu já achei que o esporte era o programa de domingo a tarde ou o momento de diversão entre a aula de biologia e a de matemática. O alívio e a distração frente às obrigações do dia a dia; “o respiro e a descontração do povo brasileiro”.

O esporte traz o sorriso, a leveza e o lazer entre as coisas importantes.

Ainda que relevante, essa visão coloca-o em segundo plano – o “apoio” para as coisas principais, e não no protagonismo. Não enxergava o que hoje enxergo: o esporte é >ferramenta< para se atingir coisas importantes. Pela expressão coletiva do movimento a partir de um conjunto de regras bem estruturadas, é um potente artifício para a mudança interna, coletiva e social. É uma representação didática e divertida da humanidade: espaço pra gente se aventurar a trocar, a se arriscar e a sonhar.

Queria que as pessoas vissem que o esporte *pode ser* uma filosofia de vida.

Que o esporte *pode ser* uma cola e uma ferramenta social. Que o esporte *pode ter* um papel transformador e desenvolvedor igualzinho ao da educação; ainda, que uma coisa não consegue existir plenamente descolada da outra. Que mente e corpo não são entidades a parte, e sim um todo integrado. Que tudo isso o esporte *pode ser*, mas não necessariamente *é*. E que ele também pode habitar o espaço da alienação, da competitividade excessiva, da vaidade, do egocentrismo e do individualismo, da lógica de mercado e da hierarquia. O olimpismo entra justamente ai como a defesa dos valores que acredito – para o esporte e para a vida.

 Pelas Olimpíadas, o mundo se encontra e se conhece.

De que outra forma veria qual a cara de um cidadão de Guam, Santa Lúcia ou Fiji? De que outra forma ficaria incomodada com a diferença injusta de poder entre as nações? De que outra forma construiríamos sensos globais de pautas importantes – raça, gênero, clima, desigualdades?

 Pelas Olimpíadas, a gente é convidado a sonhar; nos sujeitamos ao exercício mental de projeção, treinamos o músculo da especulação e exercitamos a esperança. O mundo inteiro tem a chance de acreditar e dar estes saltos de fé. Por meio destes exercícios, construímos imaginações coletivas que atuam como cola social na direção de novos futuros.

 A gente da pouco foco para o poder do espaço, das relações e das ferramentas mas eu acho que é esse tipo de coisa, meio invisível a olho nu, que tem o poder de mudar o mundo.

As Olimpíadas são uma fábrica de sonhos – não só o sonho do atleta ou do ouro, mas é por meio deles que se constrói o sonho de uma vida com esperança – combustível para seja lá qual for a mudança necessária a cada contexto.

FLORA PFEIFER – Cientista comportamental e corredora há 10 anos, utilizo a corrida como metodologia de criação e plataforma de descobertas sobre o comportamento humano. Embaixadora ASICS FrontRunner, em defesa de uma mente sã em corpo são.

Wanderlei Oliveira

Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

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Wanderlei Oliveira

 

Iniciou no atletismo em 1965. Já percorreu o equivalente à três voltas ao redor do planeta Terra. Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

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