Os caminhos até a Maratona de Boston

SWARA Boston Marathon

PRIMEIRO CAPITULO: QUEM É VOCÊ NA FILA DO PÃO?

Meu nome é Swara, filha, mãe, esposa, advogada e corredora, tudo junto e misturado. Super
normal? Qual a mulher moderna que não é mil e uma utilidades? O que eu posso trazer para vocês sobre minha trajetória…
Posso abrir um parêntese aqui? Foi uma fase de minha vida muito difícil, desafiadora e de
muitas perdas, sofria diariamente, sentia uma dor profunda, aguda, daquelas que a vontade é
de fazer qualquer coisa para não sentir…
Não é minha intenção dramatizar, mas acho que dizer isso faz sentido, porque reconheci na
minha jornada muitas pessoas que estavam assim, que “sem querer” foram ajudadas por mim
e na corrida uma bênção.
Eu sempre fui atleta, jogava handebol e durante anos competi, aliás minha vida toda foi nesse
ambiente, quando finalmente terminei a faculdade de Direito, defendendo-a em quadra local
e nacionalmente, aposentei o tênis e prossegui minha vida pacata de ciclista (mountain bike) e
academia. Naquela época a corrida não era essa festa apoteótica, eram eventos pequenos aqui
e ali. Mas na minha academia tinha um grupo de corrida e todos diziam que eu deveria treinar,
que eu ira amar.
Eu pensava com meus botões: Deus me livre…


SEGUNDO CAPÍTULO: CORRER? DEUS ME LIVRE!!!


Então, há 6 anos fiz uma corrida de rua, a energia foi surreal!!! Resolvi viver mais essa
experiência e comecei a treinar na esteira mesmo. No primeiro ano estava sem assessoria e
fazia as corridas de rua só pela “vibe”. Gostava de participar dos eventos, fazia pelo menos
duas por mês, porque era o que dava no bolso, pense numa brincadeira boa! Comecei a
ganhar uns pódios e aí iniciei treinos no segundo semestre de 2018, foi um ano massa, o
contato com esse mundo e as conquistas pessoais que vinha alcançando me motivaram a
continuar.
Minhas provas eram de 5km e depois 5 e 10km. Nunca, em tempo algum, pensei em fazer uma
Maratona, via muitos treinarem, viajarem para fazer provas, meu Jesus, que doidice danada!!!
Pra que isso? Viajar para correr?!!!
Estava muito feliz com minhas escolhas, fazendo as provinhas por aqui mesmo e cidades
vizinhas. Em novembro de 2019, uma amiga corredora veio à minha casa e eu tive a
“brilhante” ideia de perguntar como tinha sido a Maratona do Rio de Janeiro que ela tinha
feito naquele ano… (para que eu fiz essa bendita pergunta?). Ela, que quase não fala, começou
sua narrativa… parecia um conto de fadas, que perfeição eu via o filme todinho passando…
Foi inspiradora, empolgante, emocionante, mas não pelos kms percorridos, e sim pela forma
como ela descrevia, parecia que o UNIVERSO conspirava para tudo acontecer, desde a trilha
sonora aleatoriamente escolhida (remetendo a sua adolescência – Lulu Santos), aos amigos
que cruzaram e acompanharam-na no trajeto…
Eu perguntei qual era a época que acontecia a Maratona do Rio e ela disse: em junho. PLIN…
Nessa hora deu um click, eu meio que surtei, fui olhar a data que estava programada a prova
para 2020, acreditem, no fim de semana do meu aniversário. Eu que não curto festas de aniversário, disse sem pensar, EU VOU. De repente deu aquela vontade de viver essa
experiência, mesmo sem saber quão duro é o ciclo de treino de maratona.
Fiz minha inscrição em novembro de 2019, mas em 2020 não tivemos a prova, COVID-19 parou
o mundo, cancelando até a mais famosas das maratonas, aquela que nem a 2ª GUERRA
MUNIDAL parou, BOSTON MARATHON.


TERCEIRO CAPÍTULO: VIREI MARATONISTA

SWARA Maratona do Rio de Janeiro


Em novembro de 2021 fiz a minha 1ª maratona e foi um presente de Deus, tive a melhor prova
de toda a minha vida também só tinha feito uma e foi maravilhosa, igual a cidade do Rio
de Janeiro, em todas as fotografias meu sorriso retratava minha alegria, minha gratidão, meu
amor pela corrida, aquele sorriso largo, de canto a canto.
Atingi um tempo surpreendente para o que eu esperava, meu treinador ficou feliz, todos
ficaram. Eu estava feliz demais, a prova linda que realizei, que consegui. Todos falavam do
tempo sim é massa, é top, mas além disso tem o coração, o pensamento e sobretudo a
dedicação e os limites que foram ultrapassados, isso tudo vai além de qualquer cronometro
que fechou em 3:34h.
Quando cheguei ao Recife, uma corredora experiente soube do meu tempo e me mandou a
seguinte mensagem: “Você tem que ir para Boston, você fez índice, sabe quantas pessoas
tentam? Querem? Você tem que ir.” Eu nem sabia qual era o índice de Boston, mas aquela
minha 1ª Maratona me deu esse presente. Bom, já que cheguei até aqui, por que não investir
no índice para Boston?!!!
Eu não acreditei, eu nem pensava nisso, OXE! Eu nem pensava em ser maratonista.
Caramba de fato consegui. Meu treinador disse vamos treinar, quero você em Boston no
próximo ano. Você vai treinar para fazer um índice em 2023 e fazer Boston em 2024. Eu, que
nunca pensei em fazer uma prova fora, comecei a visualizar essa possibilidade. Virando o ano
de 2023, no dia 05 de fevereiro, às vésperas do início do ciclo de treinamento, já inscrita na
prova alvo (SÃO PAULO CITY MARATHON em 31/07/2022), sofri um acidente pedalando (minha
segunda paixão esportiva, mountain bike), que me tirou das pistas por 3 meses e ameaçava
comprometer a realização dessa prova.
Sofri muito, tirar a corrida de mim assim? Pensei, vai dar certo, não posso desistir. Então fiz o
que estava a meu alcance para não comprometer minha saúde, fui liberada para alguns
exercícios e me dediquei a eles com muita força, não poderia perder músculos nem
capacidade aeróbica. Tive ainda mais foco, determinação, disciplina, tive muito amor e carinho
de todos que torcem por mim e me admiram.
Eu temia não conseguir alcançar novamente o índice, foram só 3 meses de dedicação
específica, mas fui fazer o que eu amo, CORRER.
Todo esforço me mandou junto e a uma linda delegação de pernambucanas à cidade São Paulo
para realizar a SÃO PAULO CITY MARATHON. Eu fiz uma prova maravilhosa, linda, de percurso
difícil, porém com tranquilidade, uma prova de respeito a mim, ao meu corpo.
A fria capital paulista me abraçou calorosamente e me presenteou com o tempo de 3:32h,
consegui diminuir 2 minutos da prova anterior (MARATONA DO RIO EM 2021), mas com o
detalhe, a prova de São Paulo, na minha humilde opinião, é mais dura e desafiadora.

E finalmente chegou a hora de se preparar para a tão sonhada prova de Boston, mais um ciclo
maravilhoso, teve o preparo de base com musculação mais intensificada e menos volume de
rodagem, músculos construídos e fortalecidos, agora é hora de rodar, programação de um
ciclo de maratona bem elaborado e muito estruturado. Tive o apoio de profissionais que
cuidaram de mim durante todo o momento: nutricionista, fisioterapeuta e treinador, time que
carrego comigo sempre
Finalizei meu ciclo me sentindo bem, forte, preparada, tranquila.


QUARTO CAPÍTULO: BOSTON, AÍ VOU EU!!!


Tudo pronto, passagem, hospedagem, dólar, mala, suplemento e roupa da prova na bolsa de
mão, claro, porque se a bagagem for extraviada eu garanto a minha prova.
Perdi o voo. Dentro da sala de embarque, que agonia, que absurdo, mudaram o portão
ninguém avisou, ninguém me chamou… não tenho como comprar outra passagem assim, vou
desistir???
Nossa, que estresse, meti o cartão para cima e disse, agora eu vou, depois vejo esse prejuízo
com cabeça fria…
No dia seguinte embarquei, ufa. Boston, cheguei!!! Que festa é essa, minha gente?!
Acompanhava as novidades através do grupo de brasileiros que iriam para Boston e algumas
outras pelo Instagram, mas NADA se compara ao que montaram lá. Posso dizer sem sombra de
dúvidas que Boston é a Disney dos corredores, assim, alta produção, a cidade parou para
montar e receber 32000 corredores do mundo, alow, Brasil!!!!
Não era receber os corredores de Elite profissional, era receber TODOS os corredores, deixa eu
tentar dizer aqui. Durante 42,195km, todo o percurso, clima frio, chovendo, ventando, eu
procurava um metro sem gente e não achei, eu procurava um segundo de silêncio e não era
possível. Eu tentava me concentrar em meus pensamentos, mas só ouvia: “good girl”, “You’re
great”, It’s almost there”, “keep going” dentre tantos outros impulsos e barulhos de sinos,
aplausos, gritos, além das crianças estendendo a mão para um HI 5. Ei! Eu era celebridade e
não sabia kkkkkk.
Quando senti dor, na ultima subida, vinha uma voz, “you got it”, “come on”, não tinha como
desistir, sabe, não tinha como decepcionar, era energia, era muita comoção.
Quando eu virei a esquina para pegar a Boyston, uma multidão esperava gritando sem
descanso, naquela hora não só os espectadores me ovacionavam, mas meu time de torcedores
brasileiros, que acompanhavam minha rota pelo aplicativo, pulsava no meu coração, meu
marido, filhos, mãe, coach, nutri, fisio, amigas e amigos, todos que torcendo por mim.
Eu cruzei o pórtico com um sentimento de realização que não define tudo, mas que me
dignifica, que me enche de amor pela CORRIDA e por TODOS que me cercam nesse universo.
O que eu tenho a dizer: tudo valeu à pena!!! Faço por mim, faço por amor, faço para ser feliz e
proporcionar essas emoções as pessoas que me cercam. O que mais me marcou neste ciclo foi
o fortalecimento de muitos vínculos de amizade e a certeza de que quem está do meu lado
está comigo.
Já estou me sentindo nova para outras conquistas, novos desafios. Isso é o que a corrida traz
para mim.

Swara Ferraz de Sá Barreto, 47 anos, advogada, 3 horas e 35 minutos na Maratona de Boston. Instagram: @tirinhasdaswara

Wanderlei Oliveira

Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

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Wanderlei Oliveira

 

Iniciou no atletismo em 1965. Já percorreu o equivalente à três voltas ao redor do planeta Terra. Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

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