Corrida e depressão!

Fabrício de Carvalho Honório

Como superei a depressão através da corrida!

Fabrício de Carvalho Honório, 57 anos, Instagram: @fabrício_gafas

Em novembro de 2018 meu filho me convidou pra voltar para a academia de um grande amigo que fica a 300 m do nosso prédio, comentando que eu estava muito estressado e sedentário.

Há tempos vinha notando que minha produtividade não era a mesma. Sempre fui acostumado a trabalhar muito nas duas profissões (engenheiro agrônomo e depois advogado). Gostava de acordar bem cedo para trabalhar, por volta das 5h já estava de pé, independente da hora que me deitava.

Totalmente sedentário desde 2014, trabalhando de 12 a 14 horas por dia

Dormindo pouco e me alimentando razoavelmente bem, porém ingerindo muito álcool, porque na época curtia muito as cervejas artesanais e vinhos tintos.

Acabei aceitando a proposta e nos inscrevemos na academia.

No dia 03/12/2018 fui à academia e um dos sócios, meu amigo, me convidou para fazer uma avaliação com ele, numa balança de bioimpedância, quando constatei que estava com 28,6% de gordura corporal total e desses 12% eram gordura visceral, muito perigosa para a saúde humana.

Naquele dia falei com meu amigo, educador físico e empresário, que além de fazer musculação e melhorar minha alimentação, tinha vontade de voltar a correr.

Desde pequeno, por volta dos 8/10 anos gostava de correr no colégio e na rua, seja brincando, seja correndo dos meninos brigões e mais fortes, seja jogando futebol ou disputando pequenas corridas com amigos. Sempre me destaquei pela velocidade. Era magérrimo.

No voleibol também me destaquei pela explosão e impulsão. Na adolescência cresci até os 1,70 m mas tinha muita impulsão e jogava na posição de atacante, surpreendendo meus adversários com bolas rápidas e baixas na ponta da rede ou no centro (chamada de cortada mexicana). Na Universidade Federal de Goiás joguei na seleção do time de voleibol do curso de Agronomia, e nos quatro anos ganhamos medalha de ouro (82) e prata (83 a 85), e nas olimpíadas universitárias sempre joguei handebol e corri os 100 m rasos, sem grande brilho na corrida, mas era dos poucos que gostava e se atrevia a disputar.

Aos 20 anos aproximadamente, corri uma meia maratona, ali por volta de 1984 ou 85, promovida pelo SESC em Anápolis/GO, que ficava bem de frente para a casa de minha mãe, lugar onde passei minha adolescência e início de vida adulta até os 21 anos, e onde me iniciei nos esportes, principalmente no voleibol, mas ali também praticava com afinco a patinação, chegando a ganhar torneios. Essa meia maratona não tinha staff, hidratação, nada, e foi feita debaixo de um sol de lascar. Nunca havia treinado para corrida, mas cheguei bem, em 6 lugar e só não cheguei em 3 lugar porque me deu uma dor de facão (aquela lateral no abdome) faltando 1500 m para a chegada…tive que parar e fui ultrapassado.

Voltemos para 2018

Naquele 03/12/2018 voltei a me exercitar na academia com musculação e funcional, e sempre fazia de 1 a 2 km de aquecimento na esteira. Estava me sentindo muito bem com a retomada e passei a tomar mais água e me alimentar melhor, com a ajuda de uma nutricionista e um grupo motivacional da academia no whatsapp. Eles sempre faziam desafios para ver quem perdia mais gordura num período.

Tudo ia bem, até que no dia 06/02/2019, apenas dois meses de retomada, eu e meu filho, também advogado e meu sócio, fomos assaltados no escritório, 11h30 da manhã. Assalto a mão armada, estávamos só eu e ele e o resto da turma estava em atividades externas e já iriam almoçar. O cara pediu nossos celulares e correntes de ouro, mas não satisfeito, nos trancou numa sala e limpou o escritório, levando 4 notebooks e meu HD externo, no qual tinha o backup da minha vida e iniciava naquele dia um backup na nuvem, mas como era 1,5 TB, levaria alguns dias para terminar.

Conclusão, em 10 minutos fiquei sem meu acervo profissional de uma vida toda, 33 anos de agronomia e 10 de advocacia, fora as fotos pessoais de família.

Isso me deixou transtornado, perdi o chão e não conseguia me encontrar.

Uma forte crise de ansiedade e depressão tomou conta de mim

Não queria mais sair de casa, nem trabalhar, sendo que meu escritório fica ao lado do prédio onde moramos.

De fevereiro a abril fiquei só em casa, e o único lugar que frequentava era a academia, até que minha esposa me convenceu a procurar ajuda médica. Comecei o tratamento da depressão e ansiedade em abril/2019 com medicamentos para depressão e ansiedade. Depois tive que tomar outro medicamento para controlar os pensamentos negativos.

Eu pedia a Deus para me levar, queria morrer, mas não tinha ideações suicidas. Desânimo total, mas o remédio ajudou.

Em meados de 2019 comecei a correr com um grupo de corrida da academia. Eram 3 a 5 km pela cidade, em grupo, duas vezes por semana. Quando chegou novembro comprei um tênis de corrida mais adequado e comecei a correr sozinho ou com um amigo/amiga. Fui evoluindo até 7-10 km, mas sofrendo muito depois na recuperação com dores nos joelhos (falta de fortalecimento específico, vim a descobrir depois).

Em março de 2020 veio a pandemia e tirou todo mundo das ruas. Continuei correndo em horários desertos e com a máscara no pescoço…qualquer pessoa que fosse cruzar comigo ou ser ultrapassada, colocava a máscara. A empolgação aumentou com um outro grupo de corrida virtual que um amigo educador físico montou antes da pandemia. Eram desafios mensais com tênis para quem cumprisse a distância mínima mensal de 60 ou 100 km, através de sorteio. 

Dia 01/maio/2020 comecei a treinar com a Corrida Perfeita, assessoria virtual que me proporcionou um grande avanço e evolução na corrida de rua. Descobri que o meu problema de dores nos joelhos era falta de fortalecimento específico, e me dediquei a isso, de forma que em pouco tempo as dores sumiram. Isso me deixou ainda mais empolgado, motivado, passei a ter objetivos e metas, planos, ou seja, minha vida ganhou um sentido a mais com aquilo.

Fui evoluindo bastante e me transformando emocionalmente e fisicamente

Minha gordura corporal baixou de 28,6% para a média atual de 10%. Não me importei com isso e me dediquei ao fortalecimento e treinamento de corrida, melhorei muito minha mecânica e fui me tornando cada vez mais forte, alegre e motivado, ao ponto de ter alta da medicação em novembro/2020.

Veio o fim de ano e continuei correndo firme, mas sem objetivos com provas por conta da pandemia. De meados de janeiro até meados de fev/2021 fiquei sem correr para tratar um início de canelite, que foi solucionada com um ajuste na mecânica, indicado por meu treinador. Em março/2021 decidi que iria correr uma maratona, e escolhi Florianópolis, pois a maratona seria em 29/08/2021, ou seja, teria 6 meses para fazer um bom ciclo.

Meu pace antes de treinar com planilhas era de 6:30 a 7:00 em distâncias longas, já tinha até corrido 21 km sozinho umas três vezes, mas sempre acima de 2h. Em 13 meses de treinamento melhorei meu tempo. Em dez/2020 fiz 21 km em 1h41, e quando foi junho e julho, fiz duas meias em 1h30 (4:16 de pace, inacreditável!).

Ainda em janeiro de 2021 recebi um e-mail da Loja Korrer, que tem a maior loja física de tênis para corrida/caminhada do Brasil. É especializada só em corrida/caminhada/tracking e trail run. 

Um dos sócios da Loja Korrer idealizou um projeto chamado Libertadores da Korrer, que reúne corredores amadores que tiveram superações na vida, como câncer, violência doméstica, depressão etc. Viram minhas postagens motivadoras e ficaram sabendo de uma live que fiz com a Corrida Perfeita, sobre a experiência de me libertar da depressão através do esporte, no caso a corrida de rua.

Fui convidado a ser um dos 41 membros dos Libertadores da Korrer, que não têm patrocínio ou vínculos obrigacionais com a Loja. Ganhamos presentes, mimos, mas não é patrocínio e nem temos metas a cumprir, postagens diárias. Postamos quando queremos sobre qualquer coisa de corrida em que marcamos a loja e a nossa hashtag #libertadoresdakorrer , pois o objetivo do grupo é incentivar e motivar pessoas a superarem seus obstáculos na vida, sempre com base em bons sentimentos e valores, respeito às minorias e às diferenças, respeito aos animais e ao meio ambiente etc.

Com isso, minha motivação e alegria foram ainda maiores

E, até hoje participo do projeto, que agora vai ter uma mudança em função de novas estratégias da empresa, que além de 3 lojas físicas no médio Itajaí/SC, tem o e-commerce que despontou longe nas vendas.

Para concluir, uma realização maravilhosa que aconteceu em função da Loja Korrer.

Estava no meio do ciclo da maratona para Floripa, quando saiu a notícia, uns 2 ou 3 meses antes, do adiamento da prova para 28/08/2022. Não fiquei triste, pois compreendia a necessidade diante da pandemia. Resolvi então que correria ou aqui em Luziânia/GO, onde moro, ou em Brasília, que fica 60 km daqui, no mesmo dia 29/08/2021, e comecei a postar sobre isso, tentando mostrar às pessoas que não podemos desistir de nossos planos quando surgem imprevistos, buscando alternativas para aquilo.

O pessoal da Loja Korrer ficou sabendo disso, e num belo dia recebi ligação do Dênis Hardt, sócio da empresa. Ele me disse que ficou sabendo do meu propósito e se ofereceu para me apoiar nessa corrida, fosse em Brasília, Luziânia ou lá em Floripa. Teríamos uma divulgação da “maratona do gafas” (gafas é uma corruptela de gafanhoto, apelido que ganhei na universidade em 1982 e me acompanha até hoje, tanto pela minha magreza, impulsão no volei e pelo personagem Gafanhoto do mestre Kung Fu na TV…lembra?)

Achei melhor ir para Florianópolis

E assim foi, mas no meio houve uma notícia ainda melhor. O Dênis é amigo e parceiro do Fabiano Braum, dono da Floripa Runners, maior assessoria de corrida de SC, que resolveu fazer o mesmo que eu com os atletas da assessoria, realizando uma Maratona Interna da assessoria, com distâncias de 6, 21 e 42 K. Eu era o único atleta que não era atleta da Floripa Runners. Aliás, na véspera conheci outro atleta que não era deles, mas trabalhava como mecânico de bikes da Sense, uma loja da marca muito bem posicionada por lá, e que serviu de ponto de apoio para entrega dos Kits de corrida e também onde seria a largada. 

A corrida tinha quase todo o aparato de uma prova oficial, porém o percurso tinha um pequeno diferencial em função de não haver bloqueio de ruas, então não passávamos pelo túnel que liga as pontes à ciclovia da costa sul da ilha. Tinha que subir um morro e pegar a ciclovia no encontro com a pista do túnel. Havia mesas de hidratação e comida em quantidade suficiente, e com muita variedade de comida e bebidas, inclusive isotônico e coca-cola.

A corrida foi coberta pela empresa Foco Radical, que fotografou em alguns pontos do evento, principalmente na icônica Ponte Hercílio Luz.

Saída às 6h com 17 graus e chegada com 19 graus…não ventou e só caiu uma garoinha fresca quando saí da ponte para pegar o morro do túnel. 

Como era minha primeira vez nos 42 fui orientado a seguir um tempo de prova de 3h25´, mas fiz em 3h16´ (pace médio de 4:39/km), isso porque economizei muito no ritmo e só dei um sprint nos 2 km finais.

Alegria em começar da estaca zero não é para qualquer um! 

Sou forte! Sou capaz! É uma superação, é um novo estilo de vida, é o amor pela corrida!

Muitas pessoas que me seguem ou que me vêm correndo acabam se influenciando e começam a correr, seja para se livrar da depressão ou para melhorar a saúde. É muito bom ajudar as pessoas assim!

VIVA O ESPORTE!

Wanderlei Oliveira

Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

Adicionar comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Wanderlei Oliveira

 

Iniciou no atletismo em 1965. Já percorreu o equivalente à três voltas ao redor do planeta Terra. Técnico fundador do Clube Corpore, em 1982, e do Pão de Açúcar Club, em 1992. Desde 2000 é comentarista e blogueiro.

Categorias

O que andam falando…